segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

Bundas

Você vai pensar em ficar com todas antes de ficar comigo. Eu não tenho bunda. Eu não tenho dote. Nem carro eu tenho pra ir te buscar tão longe. O amor nos tempos do capital exige cuidados, beijinhos e uma boa quantia de dinheiro em espécie.

Os homens com quem eu ando só saem com garotas que moram no centro. Para ter chances, tento não parecer suburbana, mas minhas unhas roídas e lascadas me entregam de imediato. Meu modo de agir, de pensar, de me expressar não me deixam mentir por nenhum momento. São 18 anos de Pedreira. Pedreira é transpor as barreiras que me separam de qualquer paixão.

Eu poderia ter nascido nos grandes centros urbanos do planeta. Minha língua seria o inglês e os milhares de falantes, do Alaska ao pacato escocês, me entenderiam. Entenderiam que para nascer brasileira, é preciso ter ginga e um belo par de peitos. Apenas uma conta bancária de encher os bolsos da bolsa podem te libertar da condição de investir cada centavo na beleza exterior.

Se um dia Deus quiser de novo me enxotar do paraíso, que ele não me chute para o Brasil. Aqui é o inferno nascer mulher, amargo feito a burca que vestimos disfarçada de bíquini e batom.

No meu primeiro pé-de-meia, produto de muito suor e elaboração intelectual, não esperem que eu me afunde em livros, que eu pense em ter filhos triviais, ter automóvel ou casa própria. Eu vou turbinar a comissão de trás. Ser brasileira é trocar a pátria pela preferência nacional.

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